Em 21 de setembro de 2020, meu sócio Vitor criou um arquivo no Google Docs chamado Diving into Darkness (mergulhando na escuridão). Era uma estratégia para impedir que nossa empresa não quebrasse nos próximos dois meses.
Naquela época nós tínhamos uma agência de design que operava 100% via WhatsApp. Profissionais autônomos entravam em contato com uma central de atendimento e pediam peças de design como logos, materiais para redes sociais e vídeos.
Chegamos a ter 30 pessoas muito talentosas conosco e faturamos alguns milhões entre 2017 e 2019. Construímos essa empresa do zero, sem investir um tostão. Em janeiro de 2020 nosso modelo de negócios simplesmente ruiu. Nossos principais clientes, que eram profissionais da saúde, fecharam os consultórios.
Só pra vocês entenderem o tamanho do problema: de março a agosto de 2020, nosso faturamento mensal caiu de R$ 120.000,00 para R$ 20.000,00. Tínhamos uma dívida de R$ 140.000,00 com o banco e uma de R$ 77.000,00 com o Facebook. Entramos no cheque especial e no Serasa.
Nós usávamos o cartão de crédito para pagar o outro cartão de crédito. Tivemos que reduzir drasticamente o quadro de colaboradores e sacar nossas economias para continuar pagando os que restavam conosco. Ficamos mais de 1 ano sem receber salário e estávamos prestes a arruinar nossa vida financeira aos 24 anos de idade. Muitas pessoas teriam desistido aqui.
O fôlego veio com uma ideia simples que transformou completamente a nossa trajetória.
No terceiro trimestre de 2020, empresas estavam começando a testar o modelo de trabalho híbrido, então tivemos a ideia de criar um pacote com 30 peças de design que sinalizavam distanciamento social (“não sente aqui”, “não use a copa”, coisas assim) e vender por R$ 7.000,00 reais para médias e grandes empresas. Essas empresas recebiam as artes num PDF, imprimiam e colavam no escritório. Era um trabalho simples porque a gente só precisava produzir as peças uma vez e trocar a identidade visual da empresa.
Depois de vender esse pacote, uma luz acendeu na nossa cabeça: como essas empresas não conseguiam produzir esses materiais internamente, mesmo já tendo times de marketing, design e vários fornecedores? Nossa tese era de que times de marketing e comunicação precisavam de mais design do que conseguiam produzir internamente - e que isso podia estar afetando sua capacidade de executar as estratégias.
Mergulhando na escuridão
O conteúdo do documento Diving into Darkness eram os passos necessários para pivotar a empresa em dois meses e testar essa tese, faseando todas as atividades e entregáveis que precisávamos executar para fazer essa transformação.
Para comprovar essa tese precisávamos de duas coisas: um produto/serviço mínimo viável e um canal de distribuição para vender.
O Vitor inventou o produto em alguns dias: o que chamamos hoje de créditos criativos. Ao invés de contratar escopos fechados ou horas mensais, times de marketing compravam moedinhas e trocavam essas moedinhas por itens de design para ajudar na execução das suas estratégias. Eles preenchiam um briefing online, enviavam por Slack ou WhatsApp e nosso time entregava a peça em 24 horas.
Para testar a distribuição, eu puxei 100 contatos de times de marketing no Brasil e mandei emails frios com o assunto “Comunicação interna”. Por que esse assunto? Porque eu queria fingir que era uma mensagem interna da empresa para forçar o colaborador abrir o email. Na mensagem, eu perguntava se a pessoa precisava de ajuda com design.
O resultado dessas duas ações - a criação das moedinhas e o canal de distribuição - salvou nossa trajetória.
Nas semanas seguintes, conseguimos marcar dezenas de reuniões com times de marketing. Uma empresa francesa de capital aberto comprou R$ 36.000,00 na primeira call que fizemos, faturando um ano inteiro sem nem testar o serviço. Outra empresa de capital aberto americana pagou R$ 18.000,00 no cartão de crédito 48hs depois de conhecer a gente, sem também nunca ter testado nada.
A demanda era clara. Começamos a nos perguntar se conseguiríamos escalar esse modelo. Se ao invés de atender 10 empresas, conseguiríamos atender centenas e para isso,precisaríamos de capital para investir em tecnologia.
Em 1 de outubro de 2021, às 11h30, marcamos uma call com um conhecido, Marcello Gonçalves (que a gente chama de “Popov”), fundador da DOMO Invest, um dos principais fundos de venture capital brasileiros. O Marcello investiu na Hotmart quando era um power point e fez os primeiros investimentos no Gympass e na Loggi.
Queríamos mostrar o que tínhamos construído e montamos um Power Point tosco com 3 slides em preto e branco explicando como queríamos transformar essa empresa de serviço numa empresa de tecnologia. No final da apresentação, o Marcello disse “quanto vocês precisam pra colocar isso de pé?". Não havíamos nos preparado para essa pergunta, então chutamos um número (acho que foi R$ 1 milhão de reais).
O próximo passo era encontrar um CTO, porque nenhum fundo de VC investe em empresas sem um CTO.
Em 2007, quando eu tinha 13 anos, conheci um cara chamado Douglas Fischer. O Douglas é um daqueles prodígios que programa desde os 10 anos, Na adolescência ele criou o primeiro antivírus brasileiro e foi um dos primeiros engenheiros de iOS do Brasil. Ficamos amigos no Twitter, mas perdemos contato durante 8 anos.
No dia 06 de maio de 2021, eu mandei uma mensagem para ele no Instagram, pedindo recomendações de alguém que podia se interessar em ser nosso CTO, porque ele conhecia meio mundo da área de tecnologia. Pra nossa sorte, ele estava insatisfeito na empresa que trabalhava e topou entrar nessa maluquice com a gente poucas semanas depois.
Com o Douglas a bordo para comandar nosso time de tech, recebemos uma termsheet de R$ 500.000,00 do Fundo Anjo da DOMO, liderado pelo Mario Letelier (um dos fundadores do Buscapé) e Franco Pontillo (partner da DOMO e o primeiro investidor do Buscapé). Mas precisávamos de outros R$ 500.000,00 para concluir a captação. Começamos a procurar por pessoas que poderiam se interessar em completar o valor: investidores-anjo. Eu escrevi sobre a importância de investidores-anjo aqui. Vale a pena ler.
Um pouco antes disso, o Vitor ouviu o excelente podcast Café com Investidor, do Ralphe Manzoni, fundador do Neofeed, entrevistando o Paulo Silveira, fundador da Alura. O Paulo já tinha feito investimento anjo em empresas como Pipefy, ContaSimples, Gupy e outras. Parecia ser fera. Sem ouvir esse podcast, provavelmente não teríamos fechado a rodada.
Por insistência do Vitor (eu nunca imaginei que o Paulo iria querer investir na gente), mandei um WhatsApp pro meu amigo Rafael Fischmann, fundador do MacMagazine, pedindo para apresentar a gente pro Paulo. Enviamos um email pro Paulo contando sobre a gente e ele topou investir alguns dias depois, sem nunca ter visto o nosso rosto. O Paulo é desses: uma pessoa genial, com convicção e coração gigante.
Para completar os outros R$ 400.000,00 que faltavam, um amigo chamado Renato Pavan que na época trabalhava num fundo chamado KPTL, nos apresentou para o MIT Angels, um grupo de investidores-anjo formados por ex-alunos brasileiros do MIT. Eles não toparam investir na gente, mas nos apresentaram para um cara chamado Roberto Grossman.
O Roberto era na época COO da Descomplica, mas tinha feito boa parte da sua carreira no mercado publicitário. Ele gostou da ideia e topou investir outros R$ 100.000,00.
Para ajudar a gente a conseguir o resto do dinheiro, o Roberto criou grupos de WhatsApp com outras pessoas que poderiam se interessar em investir: os fundadores de uma das principais agências de publicidade da América Latina; o Marco Fisbhen, CEO da Descomplica, a CMO da NotCo, Flavia Buchmann, a Gabi Vianna, ex-CMO da Adobe Enterprise nos Estados Unidos, entre outros. Eles aportaram o resto do dinheiro e conseguimos concluir a rodada em uma semana.
Parece que levantar investimento foi fácil. Na verdade foi uma das coisas mais difíceis que já fizemos. O processo todo levou mais de 6 meses. Falamos com mais de 20 fundos de venture capital. Desconhecíamos o playbook para levantar capital: aquela coisa de falar primeiro com os fundos que você não quer, e por último os que você mais quer; usar densidade de calendário para criar FOMO, e etc. Para mais dicas sobre como apresentar para investidores, leia isso, isso e ouça isso.
Saindo da escuridão e construindo o maior ecossistema de serviços criativos do Brasil
Com o dinheiro na conta, montamos um time excepcional com pessoas incríveis. A Faster se tornou uma startup que ajuda times de marketing a produzir as peças de design que precisam com agilidade para executar suas estratégias.
Criamos áreas de Atendimento, CS, Tech/Produto, Vendas, Marketing e People. Vendemos o produto da Faster para grandes empresas brasileiras, startups, unicórnios e multinacionais. Em 1 ano e meio, nossa receita cresceu 7,7x e nosso volume de entregas multiplicou por 10x. Hoje, mais de 1/4 dos unicórnios brasileiros usam ou usaram a Faster em seus times de marketing. São mais de 90 empresas usando diariamente nossa plataforma.
Nossa equipe, que no vale da crise era de 8 pessoas, agora está chegando a 90, incluindo nossa comunidade criativa de designers e copywriters.
Desenvolvemos um produto digital de alto nível do zero, em que times de marketing podem pedir peças de design em poucos minutos para nossa comunidade criativa e organizar esses projetos de forma tão eficiente quanto o Trello. Isso libera um gargalo e permite que times de marketing possam executar suas estratégias com muito mais eficiência. Um baita desafio de tecnologia, porque é um produto sem playbook, que não existe em lugar nenhum no mundo.
Temos o maior orgulho do mundo de ter construído tudo isso sem nenhum atalho ou jeitinho e sempre levando valores como transparência, respeito, diversidade e honestidade como inegociáveis.
E o próximo passo é esse, que anunciamos há pouco tempo: levantamos R$ 8 milhões para continuar ajudando times de marketing a alcançar o extraordinário. Participaram das rodadas a DOMO, os CEOs/Fundadores de empresas como Dafiti, Neon, Yuca, Mercado Diferente e Raccoon, além de executivos que ajudaram a construir unicórnios como Gympass, Loft, Nubank e Olist. A história sobre essa rodada eu conto mais pra frente.
Nossa tese se baseia em dois fatos:
De 2014 a 2022, o principal canal de aquisição das empresas passou da televisão para o digital. Isso fez com que a quantidade de materiais necessários para executar campanhas de comunicação explodisse. Hoje existem dezenas de canais de distribuição diferentes, cada um com alta necessidade de peças de design. Isso causou um gargalo que atrapalha a capacidade das empresas de executar.
Aumentar headcount, contratar agências ou terceirizar esse trabalho para freelancers não vai resolver o problema. É necessário tecnologia para dar vazão a tudo que times de marketing que se movem rápido necessitam.
Nossos planos para os próximos 24 meses são esses:
Continuar a construir produtos que permitam que times de marketing acelerem suas produções criativas, conectando designers com os melhores times de marketing.
Construir a maior Comunidade Criativa do Brasil, trazendo oportunidade aos melhores profissionais de produzir materiais para empresas incríveis e serem remunerados de forma atrativa, num ambiente colaborativo e saudável.
Acelerar nosso time de vendas e marketing para que em 24 meses não haja uma equipe de marketing incrível no Brasil que não use a Faster.
Continuar investindo em uma empresa verdadeiramente humanizada com um ambiente de trabalho colaborativo, diverso e profissional
Fiz esse texto com dois objetivos:
1) incentivar empreendedores no início de suas jornadas e mostrar que você não precisa ter feito Standford e nem ter sido CMO de alguma startup para levantar capital e construir um negócio saudável. Eu e o Vitor não tínhamos absolutamente nada no nosso currículo quando iniciamos a Faster. Mas tínhamos um grande sonho, resiliência e nunca aceitamos não como resposta.
2) agradecer as dezenas de amigos, colaboradores e investidores que confiam nesse sonho todos os dias. Somos muito gratos porque vocês mudaram nossas vidas e esperamos que possamos ter tocado a vida de vocês de alguma forma.
Nossa jornada só está começando e se você leu o texto até aqui, obrigado por fazer parte dela. Meu email é daniel @ fstr.com.br, meu Linkedin é esse e do Vitor, nosso CEO, é esse. Avisa a gente se pudermos ajudar em alguma coisa na sua jornada.
Um abraço! :)
(obrigado Vitor Filipe, Douglas Fischer, Gabriel Ribas, Paulo Loeb, Paulo Silveira, Giovanni Salvador, Franco Pontillo, Renato Pavan, Roberto Grossman e Marco Fisbhen por lerem os rascunhos desse texto)
que trajetória incrível. Obrigado por compartilhar!
que história incrível! parabéns Daniel e Vitor, além de todo time também. obrigado por compartilhar :)